quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Desconstruindo pré-conceitos

Antes que começar a postar artigos no Blog,devo criar um breve e conciso vocabulário.

Por diversas razões,passando de contextos regionais a mundiais, pré-conceitualizamos diversos conceitos. Ao mesmo tempo,usamos antônimos como se fossem sinônimos e assim por diante. Isto é comum a todas as áreas de estudos na qual não conhecemos,da História até a Sexologia.

Como interessados,devemos buscar os conceitos corretos. Acabando por nos interessarmos mais por determinado tópico do conhecimento.Como aspirante a otomanista (aquele especializado em Império Otomano) é um sacrilégio manter tais confusões conceituais.Mas sei que para 99,99% das pessoas isso é recorrente.




                                                   Turco e árabe são a mesma coisa 

Sem demoras,abaixo desconstruo uma pré-conceitualização comum as pessoas. A de relacionar "turco" como sendo a mesmíssima coisa que "árabe". Na América do Sul, isso ocorreu pelo fato de na virada dos séculos XIX e XX milhares de árabes imigrarem para cá portando passaportes otomanos (popularmente conhecido à época como livreto vermelho). Vale lembrar que, até a Primeira Grande Guerra Mundial, os turcos dominavam uma região que cobria de Tessalônica (Grécia) até Bagdá (atual Iraque), "abraçando" o Meditterâneo Oriental. Logo, se você nascesse em cidades como Beirute, Damasco, Bagdá e Al-Quds (nome árabe de Jerusalém) você possuía cidadania turco-otomana. Mesmo que por toda a sua vida, você falasse o idioma árabe. Além de seguir costumes tipicamente árabes.

A maioria dos brasileiros que compram aquele pacote da CVC para a Turquia ficam extremamente surpresos quando aterrissam em Istanbul. Em primeiro lugar o idioma é totalmente distinto do árabe. Além da feição das pessoas.

ÁRABES: Povo de origem semita (igual aos hebreus e acadianos) originários da Península Arábica.Povo que sobrevivia andando de oásis a oásis, dedicando-se ao comércio. Apesar de tentativas anteriores de sedentarização (como a construção de Petra pela "misteriosa" tribo dos nabateus), apenas se expandiriam para além da Península nos séculos VII-VIII.
Multidão árabe em Gaza (fonte: TheGuardian,2013). Pele morena,cabelos pretos e cacheados.Estes se parecem mais com o "Turco" da 25 de março.
Tal expansão só foi possível com o advento de uma religião: o Islã. Religião monoteísta com forte inspiração do cristianismo e judaísmo,ela auxiliou a união de diversas tribos "árabes". Além disso,estabeleceu uma escrita própria e um código de leis próprio (a "Sharia"). Por fim,o ideal da Jihad (erroneamente traduzido como "Guerra Santa". Jihad significa mais algo como "A causa") motivou a conquista de já fracos reinos e impérios além da Península.
Migrações árabes (Séc VII-VIII d.c.)
O idioma árabe tem origem semita. Tal qual o hebraico e o aramaico (a língua supostamente falada por Jesus).

Exemplo de países árabes: Egito,Arábia Saudita (duh!),Marrocos,Argélia,Tunísia,Líbia,Palestina,Líbano,Síria,Iraque e os reinos do Golfo Pérsico.

TURCOS: Os turcos possuem uma origem muito mais recente. A origem deles remetem as Montanhas Altaicas,atual Sibéria Oriental (longe pacas). Os altaicos eram também nômades,sempre caracterizados por grande fluxos migratórios. O primeiro,em 10.000 AC, povoou algumas ilhas a oeste do continente. Tal migração deu origem aos japoneses.

Depois houve migrações para o Sul (originando os mongóis e coreanos). Os turcos se originariam com as últimas migrações ,lá pro século XI (d.c.) rumo a Oeste. Relativamente pouco antes de Gengis Khan iniciar a expansão de seus domínios.

Após passarem por toda a Ásia Central (sempre deixando povoamentos permanentes), os nômades alcançaram a Ásia Menor. A convite do já decadente Império Bizantino, os turcos se estabelecem na reduzida fronteira do Império,onde atualmente é a cidade de Bursa.Empregados como guardas. Em parte,foi graça aos turcos que Constantinopla não sucumbiu aos armênios,mongóis e árabes.Aliás,o contato com os árabes possibilitou a conversão dos turcos ao Islã.

No mapa,os pontos azuis representam populações turcas
Outra famosa tribo turca seriam os khazares. Ao invés de se dirigirem a Ásia Menor,foram para o atual sul da Ucrânia. Tal tribo converteu-se ao Islã,e hoje especula-se se os khazares não deram origem ao judaísmo no Leste Eurropeu.

Em 1454 os Turcos conquistaram o (já sucumbido) Império Bizantino.

A língua turca,portanto,é mais parecida com o japonês que com o árabe (tamanha a diferença entre os dois povos). Atualmente usa a escrita latina. Como podem ver abaixo,os turcos são diferentes até na aparência :mais branquinhos e olhos levemente puxados.

Torcedoras da seleção turca. Quem são os arianos agora?


Exemplo de países turcos: Turquia (duh!),Azerbaijão, todos os "Stãos" incluindo republiquetas da Federação Russa (Tatarstão,Daguestão e etc).

                                                  Todo árabe é muçulmano

Bom, em relação a esse tópico, deixemos algo bem claro: religião não está relacionada a etnia ou identidade nacional. Nem mesmo Israel, que supostamente foi construído para abrigar todos os judeus da face da terra, representa toda uma religião (o sionismo merece um tópico no Orientalismos).

O único país que represente toda uma religião seja o Vaticano. Entretanto, o próprio não seria um Estado-nação propriamente dito (com um povo com identidade nacional e étnica próprias delimitados por uma fronteira espacial). Nenhum italiano (usando mais uma vez o caso do próprio Vaticano) se diz "católico" antes de se dizer "italiano". Aliás, todo o imaginário popular voltado aos italianos não envolvem a Religião. Pensamos em sua gastronomia (pizza, massas, risotos), na sua herança histórico-cultural (os canais de Veneza, as ruínas de Roma, as igrejas renascentistas da Toscana) e até em produtos italianos e suas empresas que se tornaram famosos no mundo todo (o macarrão Barilla, a máquina de escrever Olivetti, as roupas da Valentino e Giorgio Armani, os carros esportivos da Maseratti, Lamborghini, Alfa Romeo e Ferrari).

Porém, de uma forma que não consigo explicar, relacionam diretamente os árabes com UMA das religiões que eles cultuam (Surpresa! Os árabes professam várias religiões, como todos os outros grupos de seres humanos!). O fato do árabe Maomé ter fundado o Islã não justifica essa relação direta. Até porque o cristianismo foi fundado por um arameu. E, além dos arameus existentes hoje (sim, eles ainda existem! E vivem entre as modernas Síria, Jordânia, Palestina e Israel) serem bem diferentes daqueles existentes na época de Jesus, nem todos eles são cristãos. Há judeus e até arameus muçulmanos.

Deixando isso bem claro (ao menos, assim espero), quais seriam as outras religiões professadas por povos árabes?

Em primeiro lugar, o cristianismo. Depois do Islã a religião mais professada por árabes do mundo todo é o cristianismo. E em diversas formas. O Líbano, país mais cristão de toda a região, professa o chamado cristianismo Maronita. O nome maronita provém de um santo chamado São João Marun. Natural da cidade de Antioquia (moderna Hattay,na Turquia), Marun estabeleceu naquela cidade um patriarcado. Hoje em dia os maronitas seguem a Santa Sé (isto é,reconhecem a autoridade do Papa). Tal como os católicos, os maronitas também cultuam imagens de santos.

Celebração de Domingo de Ramos nas ruas de Beirute, Líbano


Tal como os católicos, os libaneses maronitas também acreditam nas aparições da Virgem Maria. Imagem da Nossa Senhora do Baabek (ou do Líbano). O culto a santa, inclusive, é popular em toda a América do Sul.



Além dos maronitas, também encontramos católicos propriamente ditos. Se engana quem pensa que o conflito Árabe-Israelense seja um conflito entre muçulmanos e judeus. Quase um quinto de toda a população palestina é cristã. Majoritariamente composta por católicos apostólicos romanos. Devido a posição sagrada da cidade de Belém para os católicos, a cidade possui mais igrejas que mesquitas.

O catolicismo chegou à Palestina durante as Cruzadas. religião imposta pelos invasores, muitos habitantes daquela região se converteram a nova religião. Com a reconquista da "Terra Santa" pelo guerreiro curdo Al-Saadin (nosso Saladino), o novo credo foi permitido. Muito longe do fato do Saladino ser uma pessoa boazinha e tolerante. Isso ocorreu pelo fato do próprio Corão permitir que judeus e cristãos convivam junto com muçulmanos.

Curiosamente, até hoje palestinos muçulmanos chamam os palestinos católicos de "francos". Referência direta às Cruzadas.

Procissão católica na Cisjordânia. Note as cercas e muros separando os lados palestinos e israelenses. Fonte:catholicherald.com

Também encontramos cristãos não-seguidores de vertentes papistas do cristianismo. Há pelo menos três grandes igrejas de rito ortodoxo presentes no oriente Médio e Norte da África: o cristianismo ortodoxo grego, a igreja siríaca e a igreja copta.

Antes, vale relembrarmos o que seria um cristão ortodoxo. Ao contrário do que o nome possa parecer, não significa que os cristãos ortodoxos sejam mais "piegas" na sua interpretação da Bíblia.

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